sábado, 4 de dezembro de 2010

Quem fala errado é burro?

Sob a ótica do preconceito linguístico, qualquer manifestação linguística que escape do triângulo escola-gramática-dicionário é considerada "errada", e não é raro a gente ouvir que "isso não é português".
Um exemplo, na visão preconceituosa da língua, é a transformação de "L" em "R" nos encontros consonantais como em Creusa, chicrete, praca e pranta onde a pessoa que assim fala é extremamente estigmatizada, sendo considerada, às vezes, como "atrasada mental".
Estudando cientificamente a questão, é fácil descobrir que não estamos diante de um traço de "atraso mental" dos falantes "ignorantes", mas simplesmente diante de um fenômeno fonético que contribuiu para a formação da própria língua portuguesa padrão.
Observem o quadro:
Português Padrão
Etimologia
Origem
Branco
Blank
Germânico
Escravo
Sclavo
Latim
Praga
Plaga
Latim
Prata
Plata
Provençal

Como podemos notar, todas as palavras do português-padrão listadas acima tinham, na sua origem, um "L" bem nítido que se transformou em "R". E agora? Se acreditássemos que as pessoas que dizem Creusa, chicrete e pranta têm algum "defeito" ou "atraso mental", seríamos forçados a admitir que toda a população da província romana da Lusitânia também tinha esse mesmo problema na época em que a língua portuguesa estava se formando. E que Luiz de Camões também sofria desse mesmo mal, já que ele escreveu ingrês, pubricar, frauta, frecha, na sua obra que é considerada até hoje o maior monumento literário do português clássico: Os Lusíadas.
Este fenômeno que participou, inclusive, da formação da língua portuguesa padrão, chama-se rotacismo, e ele continua vivo e atuante no português não-padrão, porque essa variante deixa que as tendências normais e inerentes à língua se manifestem livremente.
Burrice, isso sim, é julgar sem ter conhecimento prévio, sem base cientifica, sem argumentos plausíveis. Falar "errado" não é sinal de burrice, como muitos acreditam, aliás, o que é falar errado? Falar diferente não pode ser considerado errado. É aí que está o preconceito. 

Publicado no blog de Leandro Rodrigues em 28/11/2007 

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